quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

HORÁCIO COSTA





OS JARDINS E OS POETAS 
                                   
                                           A Katyna Henriquez

Wang Wei pintava jardins e cultivava plantas
Na China Imperial pintar plantar jardins
Era bem mais nobre que discursar frente a um senado
            inexistente narcotizado
Cícero perora  Quintiliano  chora
Os senadores não prestam atenção
Porque observam as barrigas das pernas musculosas dos guardas
Dácios  & Mésios  & Beócios principalmente Beócios
O jardim romano era um pátio de recepção
Com 8 roseiras geométricas
64 vasos de cerâmica 128 plantas de gerânio perfeitamente
           retóricas
Horácio queria um jardim regular
O número de folhas de suas  roseiras  seria contado
O número de pétalas das rosas seria minuciosamente contado
Como sílabas de poemas estritamente sintáticos
As rosas amarelas seriam assonâncias
As rosas vermelhas consonâncias
O jardim horaciano é um Mondrian avant-la-lettre
Mas Horácio não teve dinheiro para comprar escravos que
            contassem pétalas e folhas
Silábicas
As pedrinhas das áleas como pausas poéticas
Por isso o jardim de Horácio nunca existiu
Quando nós pensamos nele nos lembramos de um jardim
        inexistente
De um jardim civil como Demóstenes
Um ágora iluminado
Por plantas cidadãos atentos à perorata
Plantas como ouvidos vegetais
Nardos como microfones
E o cipreste que se entrevê            um agente de imprensa

Wang Wei cultivou seu jardim
E enquanto plantava pintava
Seus microcosmos caligráficos com pedras trazidas de longe
Que o lago e a corrente duplicavam nas sutis tardes outonais
Etc.

Wang Wei cultivava jardins
Wang Wei pintava paisagens
Mas Ella, ah.
Ella
Ella cantaba boleros

Horácio Costa (livro JARDIM DE CAMALEÕES – A Poesia Neobarroca na América Latina :ANO 2004 - editora Iluminuras -  página 88; organização, seleção e notas; Claudio Daniel

Nenhum comentário:

Postar um comentário